Cezar Sena[1]
Estava um pouco
resistente em escrever sobre o assunto que envolve os atentados nas escolas.
Ainda abalado com os últimos acontecimentos (assassinado de uma professora de
71 anos por um aluno de 13 em São Paulo e de 04 crianças em uma creche em
Blumenau em Santa Catarina). Entretanto, a pedido da editora do Jornal da ACE –
VGP aceitei o desafio. Como o tema provocou em todos nós sensações e
sentimentos diversos, dentre eles revolta, medo, indignação, tristeza e
impotência, procurei fazer uma reflexão pessoal a partir do meu cotidiano e de alguns
estudos sobre a problemática em questão. Para quem ainda não me conhece,
apresento-me para que compreendam de qual lugar estou escrevendo: sou professor
da Educação Básica desde 1998, diretor de escola pública desde 2009 e professor
universitário desde 2008 (atuando nos cursos de pedagogia, psicopedagogia e
neuropsicopedagogia). Portanto, estou atuando como educador há 25 anos, tendo
exercido várias funções.
Posto isso, vamos à
análise. A escola é o reflexo da sociedade. Sabemos que a violência não é uma
prerrogativa das ESCOLAS, mas da SOCIEDADE que, cada vez mais polarizada, é violenta
e intolerante. A cultura armamentista, a polarização do nós contra eles e do
princípio maniqueísta do Bem contra o Mal, bem como as crises sociais
instauradas pela PANDEMIA da COVID-19 contribuíram significativamente para o
aumento dos atos de violência, intolerância e bullying nas escolas. O
que a mídia divulga é, contudo, apenas a ponta o iceberg. Nós educadores
convivemos diariamente com tudo isso há anos e, apesar de muitos apelos, quase
ninguém nos ouve, acham que reclamamos demais. Agora, devido às recentes
tragédias de repercussão nacional, o que infelizmente não foi isolado, surge
uma onda de especulações sobre a tendência de aumento de atentados deste tipo
associados a diversos supostos tipos de motivação dos crimes. Segundo o site G1[2],
“subiu
para 24 o número de ataques violentos a escolas do
Brasil desde 2002, conforme aponta um estudo da Unicamp,
foi contabilizado ao menos 23 casos até
março deste ano. O mais recente aconteceu nesta terça-feira (5) em uma creche
em Blumenau, Santa Catarina”.
É urgente,
pois, que a sociedade pare de se preocupar com questões irrelevantes ou
comportamentais (banheiros unissex, escola sem partidos, linguagens neutras,
dentre outras...) e foque no essencial: elaboração de políticas
públicas de governo e não de partidos. É necessária a criação de mecanismos
que garantam efetivamente a participação da família no acompanhamento da vida
escolar dos filhos e sejam responsabilizadas pelo não cumprimento das medidas
garantidas legalmente. De acordo com a Constituição Federal de 1988, artigo
205, a educação, direito de
todos é DEVER DO ESTADO E DA FAMÍLIA, devendo ser promovida e
incentivada com a colaboração da sociedade. Conforme aponta a
Constituição, é um dever de todos, mas o que observamos nas escolas é uma
negligência de muitas famílias. Algumas, inclusive, querem transferir todas
suas responsabilidades para a escola.
Não estou aqui, com esse argumento, colocando a culpa na
família, mas chamando a atenção para a sua responsabilidade na parte que lhe
cabe na educação das crianças de acordo com a legislação. Quando a escola
convoca os responsáveis para resolver questões da vida escolar dos alunos, ora
por indisciplina, vandalismo ou por questões de aprendizagem, muitos alegam não
ter tempo. No entanto, quando o filho reclama que algum profissional da
educação chamou sua atenção por algum comportamento inadequado de modo mais
incisivo alegam que o filho foi constrangido ou que falaram alto com ele. Neste
momento, eles arrumam tempo e vêm “brigar” com a equipe escolar, reforçando o
comportamento inadequado do filho, isso quando não há denúncia da escola antes
do apuramento dos fatos. Para elucidar, relato três episódios que acompanhei e que
evidenciam meu argumento:
1. Aluno (15 anos) foge da escola. Notificamos
os responsáveis. A mãe chega já alterada alegando que o filho saiu porque o
portão estava aberto. Informarmos que estávamos recebendo merenda escolar e ele
aproveitou a oportunidade e fugiu. Ao invés de corrigir o filho, apontou o
“erro” da escola;
2. Pai chega nervoso, acusando um
professor de ter agredido o filho. Acolhemos a acusação e informamos que iríamos
apurar e retornaríamos. Após a apuração, não foi constatado nenhum ato de
violência por parte do professor. Pelo contrário, as câmeras mostraram o
professor circulando por toda a sala de informática, conferindo os computadores
dos alunos (era dia da Prova Paulista). A gravação mostrou que o diretor e a
vice-diretora entraram na sala para verificar a conexão da internet, nem o
aluno em questão, nem os colegas relataram episódios de violência. O pai foi
comunicado para comparecer na escola para o retorno da apuração, mas até hoje
não compareceu. Agora eu pergunto: se não tivéssemos as câmeras dentro da sala
de aula? Seria a palavra de um adolescente de 13 anos contra a do professor.
Adivinhe quem levaria a culpa? Será que as autoridades e a mídia viriam
perguntar nossa versão?
3. Aluno de 15 anos leva uma arma para escola
na mesma semana do ataque que matou a professora em São Paulo. Na sala da
direção, o aluno entrega a arma (simulacro) que segundo ele trouxe para “brincar”.
Recolhemos a arma, acionamos o protocolo de segurança e a família. A mãe alega
que deram de presente a arma para o filho, pois ele, há mais de 05 anos, estava
pedindo uma arma de brinquedo.
Perceberam a gravidade do problema?
A sociedade está doente. As famílias não têm autoridade com os filhos. Têm
dificuldade de dizer NÃO para eles. Erroneamente, querem dar aos filhos o que
alegam que não tiveram na infância e, com essas atitudes, as famílias não
conseguem impor limites, fazendo com que as crianças e jovens cresçam com
dificuldades de seguir regras básicas de convivência em ambientes coletivos
exteriores à família.
Neste sentido, admite-se que educar pressupõe a coragem de
dizer NÃO. Educar é um ato ritualístico, com normas claras para todos os
envolvidos. Para a maioria das crianças, é na escola que elas têm o contato
com as REGRAS e com os limites do que podem e do que não podem fazer. Infelizmente,
é preciso elucidar que estamos criando uma geração de “mimados”, “frustrados” e
“intolerantes”. Não sabem esperar a vez, nem na fila do refeitório, querem tudo
para ontem. Precisamos, enquanto ainda há tempo resgatar alguns procedimentos
de convivência harmônica em sociedade, reforçar a defesa pelos protocolos da
boa educação, como pedir licença, por favor e agradecer.
Partindo
das observações, das vivências e das leituras, aponto três dicas para os pais
acompanharem e monitorarem os comportamentos dos filhos. Pais, não tenham
medo de ser exigentes e “chatos”. Os pais não necessariamente precisam ser
“legais”. Precisam ser pais, exercer sua autoridade com responsabilidade,
discernimento e coragem. Lembrem-se de:
1. REVISTAR mochilas e quartos. Os
quartos não são propriedade privada dos filhos onde os pais não podem entrar.
Não só podem, como devem e, de vez enquanto, inspecionar;
2. ACOMPANHAR e monitorar o acesso das
redes sociais dos filhos – ligar o alerta com o excesso de tempo conectados ou
com muito tempo no quarto fechado. O acompanhamento deve ser feito com muito
diálogo, respeito e orientação, levando em conta a idade dos filhos (determine
um tempo). Hoje existem, inclusive, aplicativos de monitoramento;
3. Fiquem atento a qualquer mudança de
COMPORTAMENTO ou de HUMOR do seu filho. Caso perceba que não consegue lidar com
a situação, peça ajuda, de preferência para especialistas em saúde mental. Não
minimize ou subestime. Lembre-se do ditado popular “prevenir é melhor do que
remediar”.
Enfim, o assunto é muito complexo,
sensível e necessário. Não dá mais para fingirmos que está tudo bem. Não está!
Precisamos juntos buscarmos soluções coletivas e colaborativas. Um dos caminhos
que considero importante é a PARCERIA de todos em prol de uma CULTURA DE PAZ
que valoriza e respeita as diferenças, pois sabemos que o “sucesso escolar é o
resultado da parceria entre família e escola em uma atitude de
complementariedade e responsabilidade. Precisamos superar essa ideia equivocada
e procurar culpados, mesmo porque não há culpados, mas responsáveis” (SENA, 2022,
p. 37)[3].
[1] Mestre em Educação – PUC/SP. Especialista em
Gestão – USP; MBA em Gestão Empreendedora – UFF. Diretor de Escola Estadual.
Professor universitário. Escritor, Coach e Palestrante. Insta: @cezar.sena
[2] Fonte: https://g1.globo.com/educacao/noticia/2023/04/05/brasil-tem-24-ataques-em-escolas-nas-ultimas-duas-decadas-relatorio-cobra-politicas-publicas.ghtml. Acesso em 07 de abril de 2023.
[3] Fonte: SENA, Cezar. Reflexões
sobre a educação no contexto da pandemia. Editora Cidade Nova, 2022.
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