quinta-feira, 23 de julho de 2020

EDUCAÇÃO SEM ESCOLA: E AGORA?



Cezar Sena

MESTRE EM EDUCAÇÃO - PUC/SP; COACH - SLAC; MBA Gestão Empreendedora - UFF Especialista em Gestão da Escola - USP; Pedagogo, Psicopedagogo e Neuropsicopedagogo. Professor Faculdade CENSUPEG e Diretor da EE Valêncio Soares Rodrigues. Insta: @cezar.sena Youtube: Cezar Sena

Hoje, mais que nunca, se percebe a importância da educação escolar. Neste período de escolas fechadas, evidenciam outras opções (aplicativos, videoaulas, blogs, lives, etc.), mas a pergunta é: como os pais vão ensinar e orientar sem procedimentos didáticos adequados? Será que os pais estão dando conta de ensinar os conteúdos? A resposta é NÃO! Por mais que tenham boa vontade, falta-lhes a didática, ou seja, o modo COMO ensinar. A educação escolar não acontece de modo improvisado, sem um planejamento pedagógico. Creio que depois da equipe da saúde, os PROFESSORES são os profissionais mais desejados (ou requisitados?) neste momento de isolamento social e de aulas remotas.

Diferente do que muitos pensam, que ensinar é fácil ou que qualquer um pode fazer, lembro-me daquele ditado: “de médico, professor e louco, todo mundo tem um pouco”. Genericamente até pode ser verdade. Mas o ato de ensinar exige que os pais, ao ensinarem, saibam fazer perguntas desencadeadoras que levem à aprendizagem. “Fazer perguntas frequentes, rigorosas e dirigidas a diferentes alunos, à medida que vão demonstrando maior domínio da matéria, é uma ferramenta poderosa e simples para trabalhar com os alunos que têm diferentes níveis de habilidades e ritmos de aprendizagem” (DOUG, 2011:60).

Desse modo, penso que se torna difícil aos pais fazerem as perguntas certas para despertarem a aprendizagem dos seus filhos, e mais árdua ainda quando se tem filhos em diferentes etapas de ensino. Muitos por não terem essa didática ou mesmo o conhecimento a respeito da variedade de conteúdo acabam perdendo a paciência, criando tensões e desgastes emocionais, deste modo, reforçando ainda mais os conflitos de gerações e de culturas.

O desafio está posto. Precisamos adequar a realidade com humildade, para reconhecer que muitos alunos ficarão para trás. Aliás, continuarão. A escola já não vinha dando conta do seu papel de ensinar todos no modo presencial, o contexto apenas evidenciou a situação. Não estou sendo pessimista ou alarmista, os dados com os resultados do último PISA** confirma essa lamentável situação.

De acordo com portal UOL* os dados do PISA divulgados no quarto trimestre de 2019, os resultados não são muito animadores para o Brasil. Em comparação com os dados de 2015, a versão anterior, quando foram avaliados 70 países e territórios, o Brasil caiu da 63ª para a 67ª colocação em Ciências. Nessa disciplina, o país supera apenas países como Cazaquistão e Bósnia e Herzegovina, ficando para trás do Uruguai, Chile e Tailândia, por exemplo. Já em Matemática, o país desceu do 66º para o 71º posto, ficando à frente apenas de Argentina, Indonésia, Arábia Saudita, Marrocos, Kosovo, Panamá, Filipinas e República Dominicana. Em leitura, o país permaneceu praticamente estagnado, conseguindo apenas passar da 59ª para a 58ª posição, ficando atrás de países como México e Romênia.

Apesar dos esforços, sabemos que o ano escolar deixará “lacunas” na aprendizagem dos alunos, especialmente dos mais pobres. O novo modelo educacional exige ainda mais dos estudantes, habilidades como: disciplina, foco e responsabilidade. É preciso que assumam um papel ATIVO diante da sua aprendizagem a fim de desenvolver sua autonomia e autoconhecimento. Por outro lado, os professores também estão tendo que reaprender seu ofício. “Isso significa concentrar-se em mudar as maneiras como as pessoas pensam e interagem e reconhecer que os estudantes aprendem de formas múltiplas e que suas capacidades não são fixadas no momento do nascimento” (SENGE, 2005:72).

Assim, com o esforço de todos, é possível minimizar os impactos que este período de escolas fechadas deixará na vida escolar dos estudantes. Sem ilusão de acreditar que tudo ficará bem como num passe de mágica. Não irá! Mas com muita dedicação dos alunos, formação dos professores com técnicas contextualizadas, com o apoio e incentivo dos pais, levaremos pelo menos uns dois anos para corrigir as defasagens de aprendizagens que já vinham se arrastando. Um dos caminhos é a superação da concepção de ensino, mais tradicional, que não leva em conta os modos como os alunos aprendem.

Erick Mansur (2015), aponta que um dos problemas do ensino tradicional é a apresentação do conteúdo. Com frequência, é tirado diretamente dos livros ou das notas de aula do professor, dando aos estudantes pouco incentivo para assistir às aulas. O problema é a apresentação tradicional do conteúdo, que consiste em quase sempre num monólogo diante de uma plateia passiva. O modelo educacional que mais tem dado resultados positivos é o chamado de “aprendizagem ativas”, defendido por Mansur no seu livro “Peer Instruction: a Revolução da Aprendizagem Ativa”. Neste modelo os alunos participam ativamente de todos os processos, numa aprendizagem colaborativa e solidária.

Como diretor de escola pública, percebo as dificuldades de adaptação neste contexto: alunos, professores e familiares, estão angustiados, com a sensação de insegurança e impotência diante de algo maior e invisível, o VÍRUS. Neste sentido, uma das saídas possíveis é o engajamento de todos numa ação solidária, colaborativa e responsável. Não podemos perder a esperança de que dias melhores virão. Mas não uma esperança passiva. Não apenas ficar esperando um milagre. Nas palavras de Cortella (2020) o grande pensador da educação, Paulo Freire, dizia que é preciso ter esperança para chegar ao inédito viável e ao sonho. Cuidado! Há pessoas que têm esperança do verbo esperar. Esse grande educador e filósofo falava da esperança do verbo “esperançar”. Esperar é: “Ah, eu espero que dê certo, espero que aconteça, espero que resolva”. “Esperançar” é ir atrás, é não desistir. “Esperançar” é ser capaz de buscar o que é viável para fazer o inédito. “Esperançar” significa não se conformar.

REFERÊNCIAS

CORTELLA. Mário Sérgio. O verbo esperançar. Disponível em: http://www.mscortella.com.br/o-verbo-esperancar-4a. Acesso em 20 de jul. 2020.

DOUG, Lemov. Aula nota 10. 49 técnicas para ser um professor campeão de audiência. São Paulo: Da Boa Prosa: Fundação Lemann, 2011.

ERICK, Mansur. Peer instrucion: a revolução da aprendizagem ativa. Tradução: Anatólio Laschuk. – Porto Alegre: Penso, 2015.

SENGE, Peter. Escolas que aprendem: um guia da Quinta Disciplina para educadores, pais e todos que interessa pela educação. Porto Alegre: Artmed, 2005.

*O PISA - Programa Internacional de Avaliação de Alunos – é uma avaliação internacional que mede o nível educacional de jovens de 15 anos por meio de provas de Leitura, Matemática e Ciências.

3 comentários:

  1. É exatamente isso, professores são fundamentais, são necessários para uma aprendizagem significativa. A pandemia trouxe a experiência de que PROFESSORES, PAIS E COMUNIDADE (SOCIEDADE) precisam sempre estar presentes e atrelados em prol do propósito do aprender a ser. Parabéns Cézar, excelente como sempre na comunicação.

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  2. Mais uma vez excelente artigo!!! Sou mãe e me sinto frustrada ao repassar para os meus filhos de 3 e 5 anos, as atividades! Realmente, como pais não temos a didática para ensinar como professores, ensinamos como pais.
    Administrar todos os conflitos atuais já tem sido um grande desafio, filtrar tudo isso e transmitir a esperança para meus filhos, me encoraja e impulsiona a buscar melhorar a cada dia, com atitudes diferentes.
    Pensando na gestão democrática, vejo que se antes não acontecia nas escolas, atualmente temos uma porta aberta para acontecer de fato a integração entre gestores, pais, professores e comunidade, com atitudes como o senhor mencionou: através do "ESPERANÇAR".

    EXCELENTE ARTIGO.

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  3. Excelente Artigo! Estou repassando para Colegas. Professores. Famílias.

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