sábado, 15 de outubro de 2016

A RELAÇÃO AFETIVA PROFESSOR E ALUNO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA APRENDIZAGEM

CEZAR SENA

Sabemos que o professor tem um papel de fundamental no desenvolvimento afetivo do aluno, pois é por meio desses vínculos construídos que facilitará a aprendizagem da criança. O educador precisa ver o aluno como um ser inteiro, que necessita de afeto e atenção, deve buscar conhecer o histórico do aluno, a convivência em família e os acontecimentos marcantes para saber agir em todos os momentos. O professor deve interagir com o aluno, buscar se aproximar mais dele, estabelecendo vínculos afetivos positivos numa relação de respeito, cooperação e solidariedade.

Numa relação humana, afetamos e somos afetados o tempo todo. Na relação entre professor e aluno esse afeto é muito maior, pois é inerente a ação pedagógica. Nenhum professor passa na vida dos alunos sem deixar marcas, sem afetá-los de alguma maneira, o ideal que este afeto seja positivo.

Mas o que é afetividade afinal? É a capacidade humana de afetar e ser afetado pelo mundo externo e interno, por sensações agradáveis e desagradáveis. A teoria de Wallon apresenta três momentos marcantes e sucessivos na evolução da afetividade: emoção, sentimento e paixão, que são resultados de fatores orgânicos e sociais (SENA, 2013).

Na teoria de Wallon, a dimensão afetiva é enfatizada de maneira significativa para a construção da pessoa e do conhecimento. A afetividade e a inteligência são inseparáveis na evolução psíquica. O aspecto cognitivo e afetivo ocorre entre oposição e complementaridade, em que, dependendo da atividade, há a preponderância do afetivo ou do cognitivo, o que não exclui um em relação ao outro, porém ocorrem alternâncias em que um mergulha para que o outro possa emergir. Entendemos a escola como um ambiente em que essas relações se evidenciam a todo o momento, no cotidiano da sala de aula, seja através de conflitos e/ou oposições, seja pelo diálogo ou por sua ausência, e pela interação ou não das pessoas envolvidas. (MATTOS, 2008, p. 54)

Que o professor possui um papel fundamental na vida do aluno, há um consenso. Mas este papel não se limita apenas na parte cognitiva, afetividade é parte intrínseca da ação docente. O professor já não é apenas um transmissor do saber acumulado pela cultura, isso os meios de comunicação fazem melhor que nós. Hoje espera que ele seja um mediador, que tenha sensibilidade para observar o que seus alunos necessitam, deve valorizar e reconhecer o que eles já sabem e desta forma estimular a criatividade, a curiosidade e o desenvolvimento cognitivo de seus educandos. Uma vez que cognição e afeto caminham juntas.

Um professor que emociona seus alunos é aquele que convida-os para uma viagem ao mundo novo, desconhecido, cheio de esperança e descobertas, provocando em cada aluno uma sensação de prazer, alegria e entusiasmo. Se o professor não conseguir provocar seus alunos para a aprendizagem, então ele não é um professor, mas sim um transmissor de informações e isso qualquer um pode fazer.

Um professor não deve ser um alienado, que não se preocupa com a vida social e cultural dos alunos, não se importando com seu futuro e com o contexto em que vivem. Nenhum professor deveria passar na vida dos alunos sem deixar marcas, sem afetá-los de alguma maneira

No fragmento do diário abaixo pode ser constatado os vínculos afetivos que se estabeleceram entre professor e alunos. Ambos afetam e são afetados pelas suas histórias, relatos, contexto social etc.

Querido diário hoje é o seu último capítulo. Sentirei muitas saudades de você, principalmente os dias de férias de julho quando eu conheci sete amigos. Momentos marcantes foi quando eu acabei o 1º diário, depois o 2º e agora o 3º diário. As excursões, piqueniques, festas dos dias das mães, volta as aulas, enfim... Bem chegou a hora mas não fique triste, talvez eu recomece outro na 5ª série. Agradeço ao professor Cezar Sena por ter me apoiado nas horas difíceis, por ter inventado seu próprio mundo, cheio de luz, educação, curiosidade, esperteza, sabedoria, travessuras, esperança, paz, amor... Agradeço muito ao professor, amigos, parentes, vizinhos e principalmente aquele ser iluminado que não olha só por mim, mas por todas as pessoas desse grande mundo que se chama DEUS. JEFERSON, 10 anos, 4ª série, 2002, [sic], (SENA, 2004:48).

A sala de aula é um ambiente onde a emoção poderíamos dizer, está sempre a flor da pele. Nesse sentido é de suma importância o professor aprender a controlar suas emoções, de modo que estimule sempre a aprendizagem dos alunos. Mas é possível controlar as emoções? Como é possível, se ela é corpórea e contagiosa?

Quando estamos sob o domínio de uma emoção, uma sucessão de mudanças ocorre em uma fração de segundos – sem que escolhamos ou tenhamos consciência imediata -, nos sinais emocionais faciais e vocais; nas ações predefinidas; nas ações aprendidas; na atividade do sistema nervoso autônomo que regula nosso corpo; nos padrões reguladores que modificam continuadamente nosso comportamento; na recuperação das memórias e expectativas relevantes e na interpretação do que está acontecendo dentro de nós e no mundo (EKMAN, 2011:81).

Nesse sentido como aponta Ekman (2011) as emoções também enviam sinais, mudanças nas expressões, na face e na postura corporal. Não escolhemos essas mudanças; elas simplesmente acontecem. As emoções também enviam sinais, mudanças nas expressões, na face e na postura corporal. Não escolhemos essas mudanças; elas simplesmente acontecem.

Como as emoções enviam sinais, poderia então, o professor prever quando está envolvido pela emoção, neste sentido é importante que o professor aprenda a reconhecer esses sinais, para evitar entrar em confrontos desnecessário com os alunos, nesses momentos onde são sequestrados pelas emoções é aconselhável que o professor tome água, respire fundo, procurando rir e tirar proveito da situação, evitando assim romper com os vínculos afetivos entre professor e aluno.

Mas afinal, qual a característica de um professor afetivo? Diria que é um professor centrado na pessoa do aluno, que compreende suas necessidades e as inclui no planejamento do ensino e que busca desenvolver na sala de aula atividades criativas, dinâmicas e que demandam participação dos alunos, de preferência em grupos, para que aprenda a conviver e que acima de tudo aprenda lidar com suas emoções.

Qual então o papel do professor diante de tantas exigências, responsabilidades? Recorro então a Wallon (1975) para dar algumas dicas, para ele:

Um professor, que tem verdadeiramente consciência das responsabilidades que lhes são confiadas, deve tomar partido das coisas da sua época. Não deve ser o mestre que lhes vem dizer: ignoro como vivem na vossa família. Ignoro qual é a vossa condição social. Ignoro o que sereis amanhã. Não acredito no futuro senão através dos vossos êxitos na escola (WALLON, 1975:223/224).

A experiência professor-aluno para que seja significativa, deve ser permeada por afetividade, pois a relação afetiva é parte obrigatória do próprio exercício do trabalho docente. Por isto mesmo, aprender é uma forma de desenvolvimento de competências individuais, além de ser um exercício constante em estar de braços abertos para todo e qualquer conhecimento. Como aponta Freire (2007:103):

Assim, como não posso ser professor sem me achar capacitado para ensinar certo e bem o conteúdo de minha disciplina não pode, por outro lado reduzir minha prática docente ao puro ensino daquele conteúdo. Esse é um momento apenas de minha prática pedagógica. Tão importante quanto ao ensino dos conteúdos (...) é o respeito jamais negado ao educando, a seu saber de “experiência feito” que busco superar com ele. Tão importante quanto o ensino dos conteúdos é a minha coerência na classe. A coerência entre o que digo o que escrevo e o que faço. (FREIRE, 2007, p.103).

A qualidade da relação professor-aluno é crucial se os professores pretendem ser eficazes em ensinar, tudo pode tornar-se interessante e excitante para os jovens quando por intermédio de um professor que tenha aprendido a criar uma relação com os alunos em que as necessidades de uns são respeitadas pelos outros (GORDON, apud PEREIRA, 2009).

O professor precisa seduzir seus alunos, despertar neles o gosto pelo saber, por aprender a aprender. No entanto para que isso aconteça é necessário, antes de tudo, que se sinta no ato pedagógico como num intenso relacionamento afetivo.

Conforme aponta Bossa (2000) a aprendizagem tem papel fundamental na constituição do sujeito humano. Ela se dá sempre pela intermediação de um outro – primeiro da mãe, lugar de excelência, depois pelos demais representantes da cultura, no caso o professor, o responsável legal para a transmissão dessa cultura.

Para garantir que as informações sejam transformadas em aprendizagem, as aulas devem ser emolduradas pela emoção, devem ser bem elaboradas, com estratégias condizentes com faixa etária e o contexto sociocultural. Levando em conta os saberes dos alunos, para que:

O professor ajude os alunos a estabelecer relações entre o que já aprenderam e o que estão aprendendo, criando em sala de aula um ambiente favorável à troca de ideias. Isso significa que os professores devem constantemente propor questões que possibilitem aos alunos refletir sobre o que sabem e o que estão aprendendo. Outras vezes, é o professor quem explicita as relações de que ele pode estabelecer entre um conhecimento e outro. As perguntas e as relações verbalizadas ajudam os alunos a perceber que a construção do conhecimento ocorre por meio de sucessivas reorganizações, as quais são feitas a partir de novas relações. (DURANTE, 2004, p. 34).

É de fundamental importância que o professor esteja consciente de que o indivíduo passa a aprender com ele e cria laços afetivos. Um dos lugares onde a criança/estudante mais se relaciona com o outro, é na instituição escolar, neste ambiente aprende a interagir, brincar, relacionar. O ato de ensinar e de aprender envolve e exige certa cumplicidade do professor, tal cumplicidade se constrói nas intervenções, através do que é falado, do que é entendido, do que é transmitido e captado.

Portanto cabe ao professor planejar e executar suas aulas para que seus alunos criem vínculos positivos entre si e os conteúdos. Quando um professor apenas transmite um conteúdo, sem nexo, sem que o aluno assimile afetivamente o conteúdo, pouco será aprendido, pois o professor necessita tornar os conteúdos interessantes aos olhos dos alunos. Pequenos gestos como sorrir, escutar, refletir, respeitar são, entre tantos outros, necessidades que levam o sujeito a investir na afetividade, que é o combustível necessário para a adaptação, a segurança, o conhecimento e o desenvolvimento da criança. Diria então que a afetividade é o combustível para uma aprendizagem significativa.

Pois sabemos, como aponta Cosenza, Guerra, (2011) que as emoções são fenômenos que nos sinalizam que algo importante ou significativo está acontecendo em nossa vida, No momento em que a emoção é ativada, afetando até a fisiologia do organismo do indivíduo, que o faz ter a tomada de decisão de afastar-se, aproximar-se ou confrontar-se, com o objeto ou pessoa com o qual está interagindo que o fez despertar aquela emoção, e consequentemente a escolha das ações futuras.

Nesse sentido o papel do professor requer uma reflexão que aponta à necessidade de mudança nos procedimentos pedagógicos dos professores, proporcionando práticas pedagógicas eficazes e contextualizadas, tendo em vista sempre a aprendizagem dos alunos, afinal o ensino só é eficaz se houver aprendizagem.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BOSSA, Nádia A. Dificuldades de Aprendizagem. Artmed, Porto Alegre, 2000.
COSENZA, Ramon M. e GUERRA, Leonor B. . Neurocência e Educação- Como o cérebro aprende. Porto Alegre: Artmed, 2011.
DURANTE, Marta; ORENSZTEIN. Miriam. O desafio de ensinar a aprender para continuar aprendendo. Pátio – Revista Pedagógica. Porto Alegre: Arrmed, nº 31, p. 33-35, agosto/outubro, 2004.
EKMAN, Paul. A linguagem das emoções. Editora Lua de Papel, São Paulo, 2011.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. 36ª Ed. São Paulo: Paz e Terra, 2007.
MATTOS. Sandra Maria Nascimento de. A afetividade como fator de inclusão escolar. TEIAS: Rio de Janeiro, ano 9, nº 18, pp. 50-59, julho/dezembro 2008. Disponível em: http://132.248.9.1:8991/hevila/Revistateias/ 2008/vol9/no18/5.pdf. Acesso em 14/08/2012.
PEREIRA, Ana Lúcia. Desvendando os mitos do bom professor: um estudo com professores da educação básica. São Paulo, 2009. Dissertação de Mestrado, Psicologia da Educação, PUC/SP.
SENA, Cezar. A relação afetiva professor e aluno, revelada por seus diários. Curitiba: Appris, 2013.
SENA, Clério Cezar Batista. CONCEIÇÃO, Luiz Mário da, CRUZ, Marisa Vieira Peixoto. O Educador Reflexivo: registrando e refletindo. Recife. Doxa, 2004.

CEZAR SENA
MESTRE EM EDUCAÇÃO: Psicologia da Educação, PUC/SP, MBA: Gestão Empreendedora Educação, UFF/SESI, Neuropsicopedagogia e Educação Especial Inclusiva (cursando); Especialista em Gestão da Escola – FE/USP, Psicopedagogo Institucional e Clinico, Especialista em Educação Infantil e Pedagogo. Professor e pesquisador CENSUPEG/BRASIL, Diretor de Escola Pública Estadual, SP. E-mail: cezar.sena@hotmail.com

2 comentários:

  1. Concordo plenamente com suas ideias é visível na escola que atuo a diferença do trabalho desenvolvido pelo professor que tem uma relação afetiva com seus alunos, que constrói vinculo, do professor que apenas cumpre uma função técnica. O resultado é muito mais eficaz do ponto de vista humano e também do reconhecimento do trabalho do professor pela comunidade.

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    1. Sim. Cumprir uma missão técnica, é razoalvemente fácil, basta dominar alguns conteúdos. Agora, despertar no outro a vontade de aprender e continuar aprendendo, é preciso mais que técnica, é preciso SER um educador, que respeita e valoriza seus alunos...

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